O que é o movimento maker e como ele poderá alavancar o aprendizado e atualizar a escola ao século XXI
Em 2014, vieram os primeiros robôs. Foi o ano em que o Programa Sabin+Esportes&Cultura criou o curso de Robótica, no qual alunos do 6º ao 9º ano do Fundamental fabricavam braços mecânicos e outras engrenagens automatizadas. O curso foi bem recebido, embora ainda desse pouco espaço para a criatividade dos jovens engenheiros. Isso está começando a mudar. Em 2016, renomeado como Programação e Robótica, o curso foi reformulado para promover uma experiência de maior autonomia ao aluno, com uma estratégia pedagógica que vem ganhando adeptos pelo mundo: o movimento maker. A reformulação contou com a ajuda de Lucas Torres de Jesus, 26 anos, um dos diretores da Caos Focado, empresa especializada em processos de inovação. Formado em Engenharia Mecatrônica, Lucas quer levar os benefícios da tecnologia de ponta para o ensino – o que tem tudo a ver com o movimento maker –, como ele explica na conversa a seguir.
O que é o movimento maker?
Existe uma expressão em inglês pela qual o movimento é conhecido, que resume bem sua essência: do it yourself, “faça você mesmo”. A cultura maker surge da democratização do acesso à tecnologia, que costumava ser vista como algo complexo, com o qual se teria contato somente na universidade, disponível só para estudantes de Engenharia. Agora, é possível se apropriar de ferramentas tecnológicas para construir objetos do próprio interesse.
De que tecnologia estamos falando?
Tecnologias ligadas à fabricação digital, termo usado para designar máquinas como impressoras 3D, de corte a laser, fresadoras, que dão forma a elementos construídos no computador. Estamos falando de kits de prototipagem eletrônica de ideias. Um deles, por exemplo, é o Arduíno, uma plataforma open source (de código aberto) muito fácil de ser usada. Existe uma comunidade ao redor do mundo que se utiliza dessa plataforma e compartilha seus experimentos.
Que benefícios elas trazem para a aprendizagem escolar?
O primeiro é inserir os alunos num ambiente em que desfrutam de autonomia para realizar seus próprios projetos. Quando falamos de um projeto maker, não estamos falando de um processo 100% orientado, como costuma acontecer, por exemplo, no laboratório de Ciências da escola. Um espaço maker é um ambiente de teste, tem a ver com exploração, experimentação. O erro é bem-vindo. Quando ele acontece, é preciso rever caminhos, pensar melhor, encontrar uma nova solução e testar para ver se dá certo. Aprende-se. Trata-se de uma cultura mais livre, que provoca no aluno uma motivação intrínseca, ou seja, a vontade de se engajar no projeto, construí-lo e vê-lo crescer. O ambiente maker promove habilidades socioemocionais, como cooperação (porque os trabalhos são feitos em grupo), criatividade e resiliência (porque ao longo do processo o aluno vai esbarrar num erro, que vai lhe exigir perseverança e criatividade).
Mas como integrar o conteúdo curricular nessa abordagem livre?
Ao longo do processo, o aluno começa a questionar o porquê disso ou daquilo. Esse é o momento em que o professor deve conectar ao projeto os conteúdos vistos em sala de aula: elementos de Matemática, Artes, Ciências, entre outras disciplinas. Trata-se de acessar o conteúdo curricular de forma bastante significativa, de aprender fazendo, na prática.
Ainda são poucos os colégios que recorrem à tecnologia no auxílio à aprendizagem?
Hoje já existe um primeiro passo mais ou menos difundido, que é o uso de computadores e tablets. E alguns colégios também recorrem à Robótica educacional. Mas, ainda assim, essas são iniciativas um pouco restritas, pois os desafios proporcionados pela Robótica aos alunos, por exemplo, são mais dirigidos. Aqui, é importante falarmos de um conceito educacional chamado “construcionismo”, que, em linhas gerais, propõe-se a trabalhar tanto os conteúdos curriculares como habilidades não cognitivas por meio de projetos de construção dos alunos. É aqui que entram os espaços maker.
E o que é um espaço maker?
É uma sala de aula ou um espaço equipado com algumas das ferramentas tecnológicas que citei. É ali que os alunos vão construir projetos de um jeito, digamos, mais livre. Isso é relativamente novo e exige adaptação da comunidade escolar. Porque ali o professor sai de sua posição clássica, da aula expositiva tradicional. No espaço maker, ele atua como interlocutor, não tem muito controle do que acontece. Leva um tempo até que o professor se adapte a essa nova realidade e se aproprie do que a tecnologia oferece.
O que é necessário para montar um espaço maker?
Para começar, é preciso um kit de prototipagem e algumas ferramentas, inclusive de marcenaria. É um investimento inicial relativamente barato, que depois pode evoluir para impressoras 3D, máquinas de corte a laser, por aí vai. Alguns colégios aqui em São Paulo já têm seus espaços maker, outros têm experimentado essas dinâmicas sem necessariamente um espaço exclusivo para isso. [N.R.: É o caso do Sabin, que utiliza as duas salas de Informática, na Biblioteca, para as aulas de Robótica e Programação. Ver mais detalhes nas páginas 12 e 13.]
Essa é uma tendência irreversível para as escolas?
Acho que é um movimento natural. Ainda educamos crianças e jovens como há 100 anos, e há um consenso nas comunidades escolares de que é necessário mudar. A tecnologia tem sido usada para criar novas relações educacionais, e esse, sim, é um processo irreversível. Os alunos já estão conectados à tecnologia, já têm contato fora da escola com esse novo jeito de aprender. Cabe à escola se adaptar a essa realidade e ajudar a formar cidadãos do século XXI.