Do campo à mesa

Agroecologia e sustentabilidade enriquecem projetos em torno das hortas do Sabin e do AB Sabin.

É preciso admitir: à primeira vista, a horta que fica no anexo do Sabin já foi mais bonita. A assessora de Ciências Adriana Alonso, uma das responsáveis pelos projetos da Educação Infantil e do Fundamental I que envolvem o cultivo de legumes e verduras, ainda lembra de quando os canteiros eram mantidos bem organizados, um só com pés de alface, outro só com rabanetes, outro só com repolhos; a terra limpa de folhas secas e ervas daninhas. Até que vinham as lagartas e formigas, ou começava uma temporada de chuvas intensas, ou fazia dias de sol muito forte… e o que seria uma boa safra de alimentos ficava na promessa. “Tentávamos fazer com que cada série tivesse contato com a horta pelo menos duas vezes ao ano, uma para plantar e outra para colher”, diz
Adriana. “Às vezes dava certo, às vezes não”.

Como explica a assessora, faltava ao projeto a aplicação de certos princípios agroecológicos, aos quais as professoras do Sabin e do AB Sabin seriam apresentadas em 2018 pela Reconectta, assessoria em Educação e Sustentabilidade que vem ajudando os Colégios a aprimorar suas atividades pedagógicas, com base nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Organização das Nações Unidas (ONU). Faltava um maior entendimento de que, na natureza, a diversidade de espécies pode ser mais forte que monoculturas; de que mesmo plantas consideradas daninhas podem ter seu valor; e de que a real beleza de um ecossistema, para quem sabe enxergar, está na qualidade das interações entre seus indivíduos.

Com a orientação da Reconectta, os canteiros “bonitos” e “bem organizados” da horta deram lugar a pés de abóbora plantados ao lado de capuchinhas e chicórias, cenouras dividindo o espaço com alfaces e rabanetes, entre outras espécies de plantas, além de muita folha seca espalhada pelo solo – e, curiosamente, varetas enfiadas na terra, com cascas de ovo na ponta.

Há razões científicas para tudo isso, como se verá adiante. Mas o mais importante é que, desde então, não só a equipe vem obtendo sucesso em termos de produtividade agrícola, como a horta, que era um espaço onde os alunos aprendiam sobre a origem e o ciclo de vida das plantas, tornou-se algo
ainda mais significativo: um microcosmo de relações saudáveis, com lições que podem ser extrapoladas para a vida em sociedade. Pelo olhar da sustentabilidade, projetos do Sabin e do AB Sabin sobre alimentos e alimentação saudável passaram a ter valor e alcance maiores do que nunca.

Há mais em jogo na escolha da comida que se põe num prato – ou numa lancheira escolar – do que apenas o paladar. Como aprendem os alunos da professora Kátia Pelinson, do Pré I do AB Sabin, a decisão entre uma fruta ou uma bolacha recheada ou entre um suco natural ou de caixinha tem reflexos diretos na saúde de quem os come. E talvez até na saúde do planeta.

De acordo com Kátia, se, no Maternal, o Colégio ainda quer sensibilizar os alunos a experimentar alimentos diferentes – fomentando neles uma importante abertura a novos sabores, cores e texturas –, no Pré I, já é possível propor em classe a discussão da qualidade desses alimentos, do que seria (ou não) alimentação saudável. “O projeto parte da observação do que eles trazem nas lancheiras para a reflexão sobre a origem dos alimentos”, diz a professora. “O suco não vem da caixinha, vem da fruta; a fruta não vem do supermercado, vem da terra. Quem plantou? Como foi isso?”

Além de fazê-los ver a diferença entre alimentos naturais e processados – e compreender que estes últimos, embora gostosos, não são “comida de todo dia”, como arroz e feijão –, essas discussões evidenciam para os alunos uma ligação que não é, a princípio, evidente, entre o que eles comem e o ambiente em que vivem. O primeiro passo para entenderem que, de certa forma, cuidar de um é cuidar do outro.

É a oportunidade de apresentar à classe a horta do AB Sabin, mas também de falar – em linguagem adequada à faixa etária – de consumismo, desperdício, consciência ambiental e hábitos que podem fazer bem ao planeta. Como, por exemplo, a manutenção da composteira do Colégio, que a turma aprende cedo a utilizar, depositando restos de lanches (ou do almoço, no caso da turma do Integral). “Eles já sabem que as minhocas não gostam de coisas cítricas, como cascas de laranja, mas gostam de mamão, de cenoura, etc.”, diz Suzy Vieira, coordenadora pedagógica do AB Sabin.

Segundo Suzy, uma das principais qualidades do trabalho com a horta e a composteira é o valor da coletividade. Nenhuma turma é dona desses projetos; todos contribuem para a composteira, todos regam a horta. “Sempre escolhemos um aluno ajudante do dia, que fica responsável pela rega; e ele escolhe dois amigos para ir junto”, diz a coordenadora.

Além disso, a horta em si pode representar uma metáfora perfeita para o valor da amizade e da cooperação. É onde entram os princípios de agroecologia recém-aprendidos pelas equipes do Sabin e do AB Sabin, que agora os repassam para os alunos. “A Reconectta nos ensinou que existem plantas companheiras e antagônicas. Abóboras se dão bem com pés de milho, mas não com brócolis ou couve-flor, por exemplo”, diz Adriana Alonso.

A assessora de Ciências enumera diversas outras lições aprendidas pela equipe: plantas altas de folhas largas protegem as mais rasteiras do sol forte; folhas secas protegem o solo do impacto das chuvas, preservando a umidade e os nutrientes por mais tempo; grãos como feijão, milho ou grão-de-bico, colhidos e deixados no solo no início do cultivo, servem como “adubo verde” para outras culturas; e mesmo plantas daninhas têm função na lavoura. “Algumas ervas são Pancs – plantas alimentícias não convencionais –, e até as que não são servem para sinalizar problemas, como a falta de nutrientes no solo. Se dá um tipo de mato, deve estar faltando nitrogênio, por exemplo”, explica Adriana.

Quanto às pragas, há soluções que se encontram na própria natureza (e na engenhosidade humana): para afastar formigas, planta-se gergelim. Para evitar lagartas, cascas de ovo espalhadas pela horta afugentam as mariposas, que “creem” estar em terreno de aves predadoras.

No fundo, o que a agroecologia mostra é como, cultivadas as devidas relações, uma espécie traz benefícios para outra, como as competências de ambas se complementam para resultar em um ecossistema mais rico, mais saudável e, sim, mais belo. Que é a lição mais importante de todas.

Compartilhe